Todo mundo tem ou teve alguma dependência na vida. Seja ela financeira, amorosa, química, física...
Se livrar das dependências é mais difícil do que se imagina. Elas sempre deixam vestígios.
Por exemplo, quando você vai almoçar com seus pais. Por mais que você já trabalhe, tenha seu dinheiro, a dependência sempre fala mais alto e você acaba empurrando a conta para seu progenitor pagar, estou errada? São os vestígios de uma dependência financeira de muitos anos, é difícil!
Dependência financeira nem é tanto o problema... O pior é a dependência por dinheiro. Tem muita gente por aí que prefere a morte a ficar sem dinheiro. A pessoa tira dele o sustento pro corpo e pra alma.
A dependência amorosa tem sintomas claros e é mais comum do que se imagina. Todos nós já vivemos isso, alguns com menos e outros com mais intensidade. Mas sempre causa estragos!
Se você já foi um dependente químico sabe que os estragos nessa área também são grandes e que iminência de uma recaída é constante.
Na maioria dos momentos, sejam eles bons ou ruins, você imagina: Putz uma cachacinha agora hein?! Ou então: Poxa se eu tivesse um cigarro!
Cara um baseado salvaria! Quem sabe uma carreirinha!
Tem gosto pra tudo né?
Eu assumo, fui uma dependente química.
Antes que alguém pense que eu fui usuária de pó, crack ou oxi, antes que minha mãe tenha um treco lendo esse post e caia da cadeira, adianto que minha dependência química se limitou ao cigarro. Droga lícita, mas segundo pesquisas destrói e vicia mais que muitas drogas ilícitas!
Faz mais de um ano que abandonei meu grande companheiro, depois do Zé é claro.
Mais que companhia ele me fazia! Não perdia nenhum momento!
Quando não estava em minha bolsa, estava em meu bolso. Passava a maior parte do dia em meus dedos, mas e depois que acabava? Ele continuava em mim, através do seu cheiro... Em meu cabelo, em minha pele, em todas as minhas roupas.
Quando paro pra pensar em todas as marcas de cigarro que eu já fumei, meu pulmão chega a contrair!
Hollywood Azul foi o último que circulou pelo meu cinzeiro, mas antes dele vieram muitos. Foi com seu primo, o Hollywood mentolado, que comecei a fumar. Passei pela fase Free, Malboro Light, algumas vezes Carlton. Muitos e muitos maços de Derby Prata, sempre com aquela ressalva: “Fumo Derby e não sou pedreiro”.
Fumei alguns Dallas, mas era sempre a última opção, praqueles dias que todo o meu dinheiro do mundo eram R$ 0,10. Tenho a ligeira impressão que aquele rato que vem atrás dos maços cigarro, morreu depois de fumar um Dallas. Um amigo meu de adolescência, o Leo, dizia que L&M dava bolha de pus no estômago, confesso que evitava comprá-lo. Do tipo, podia F%$#@ com meu pulmão, mas porque dava bolha de pus no estômago, aí não comprava! Que irônico!
Algumas vezes fumei cigarro do Paraguai, um tal de Palermo. Tempos depois vi uma reportagem que dizia que nesses cigarros, além de toda a porcaria que a gente já tem conhecimento, eram colocados barbantes moídos, mosquitos, baratas... Ai meu pulmãozinho para de contrair, por favor!
Foi difícil abandonar o cigarro. Não sei explicar como foi, mas foi difícil. Nada diferente de abandonar nenhuma dependência.
Conheço pessoas que não conseguiram, foram até a morte com seus vícios. Conheço outras que quiseram adiantar a morte por conta deles.
Tive um amigo na época da faculdade que era usuário de Crack. Ele foi internado algumas vezes. Sempre que eu podia ia visitá-lo. A clínica não era só para tratamento de dependentes químicos, mas para tratamentos psicológicos em geral. Na época da internação desse meu amigo, conheci lá uma mulher que tinha tentando suicídio após o fim de um relacionamento. Conheci também o Gustavo (nome fictício). Um cara muito bacana que também estava internado lá, mas o motivo dele era o crack mesmo.
Gustavo me relatou que se sentia muito sozinho, que só seus pais apareciam na clinica. Ele não tinha mais amigos, a dependência os afastou.
Eu não ia à clinica para visitar Gustavo, mas passei a ir também por ele. Quando meu amigo teve alta, continuei indo. Prometi a Gustavo que eu seria sua amiga.
Em uma das visitas a Tempo de Viver, estava eu confraternizando com os pacientes, comendo a pizza que o pai de um deles havia levado. Quando adentra a sala de visitas um casal religioso. Eles eram de uma paróquia próxima e convidaram os pacientes e seus visitantes para rezar.
Fizemos um circulo na sala. A mulher me olhou e pediu que eu fizesse a leitura. Li um trecho da bíblia e confesso ter ficado emocionada com a situação. Aquelas pessoas precisavam tanto de uma palavra de amor, de esperança. Terminada a reza, as pessoas começaram a se abraçar. Os religiosos se aproximaram de mim. Notei que a cara da mulher era de piedade. Ela segurou em minhas mãos e com lágrimas nos olhos disse:
“Calma minha filha! Deus está no comando das coisas, você vai conseguir!”.
Entendi direito ou fui confundida com um paciente dependente químico? Tive preguiça de explicar a ela que eu estava ali visitando meu mais novo amigo Gustavo, que depois da reza me chamou pra uma conversa reservada. Ele me confessou ter planos pra nós dois quando saísse de lá. Tinha certeza que conseguiria largar o crack se eu o ajudasse! Foi minha última visita à Clínica Tempo de Viver. Não podia incentivá-lo a largar uma dependência e se agarrar a outra. E também porque confirmei minha tese que homem não faz NADA por uma simples amizade!!!
A verdade é que a vida nos oferta muitas muletas e por acharmos o caminho difícil demais, a gente pega várias. Uma escora o lado esquerdo, outra o direito, uma na frente, outra atrás... E de repente a gente não sabe mais o que é encostar os pés no chão. Depois largar quem a gente pensa ser responsável por nos manter em pé é quase impossível!
Embora tenha largado o cigarro, tenho consciência que ainda são muitas às muletas que preciso quebrar!
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