sexta-feira, 29 de julho de 2011

Não acredito em nada não, só não duvido da fé...


Com certeza minha primeira ida à igreja foi nos braços da minha mãe. Não sei se foi no meu batismo, ou antes. Mas sei que foi cedo.
Minha avó Amália adorava contar para suas amigas beatas (não julguem como termo pejorativo):
“Minha neta toma parte de tudo na Igreja, eu mesma faço suas roupas para os teatrinhos.”

Na verdade, vovó Amália não coseu somente minhas roupas de Nossa Senhora e de Anjo, mas também quase todo meu guarda-roupa infantil.
Foi a melhor costureira que Valença já viu. Só costurava para os mais importantes brasões. Sua paciência também sempre foi grande, porque pra costurar pra mim, tinha que ter. Primeiro porque a primeira vista eu não gostava de nada. Dizia que tava ruim, que não era aquilo. Depois eu reclamava de tudo:
“Ai vovó ta pinicando”... “Ai vovó ta me espetando”... “Ai vovó tira isso que eu quero ir brincar”

Mas ao final minha roupa estava pronta e eu poderia entrar na Igreja sendo alvo de todos os olhares!
Fui Maria duas vezes. Uma na escola e a outra em um teatro da Igreja. Já coroei Maria um monte de vezes ou então entregava as palmas. Mas nunca aceitei ser o anjo coadjuvante. Sabe aquele que fica lá cantando e balançando a mão sem fazer nada? Não, esse eu nunca quis ser.

Sentava com a minha mãe no primeiro banco da igreja. Cantava as musicas tão alto que ela me cutucava para cantar mais baixo:

“PAZ, PAZ DE CRISTO. PAZ, PAZ QUE VEM DO AMOR TE OFEREÇO IRMÃOOOOOOO!!!”

“Vivianne canta mais baixo, todo mundo já viu que você sabe a letra!”.

No inicio não sabia bem o que eu fazia na igreja. Eu ia porque tinha que ir, porque aos domingos pela manhã era nosso ritual. Missa das 09:00h, depois banca de jornal para comprar O GLOBO, depois Padaria Carvalho para comprar cigarrinhos de chocolate.

Não sabia quem era Deus, nem Jesus, nem os apóstolos... Mas um dia eu quis saber. Tia Mafalda levou nossa turma do catecismo para igreja. A aula daquele dia foi na escadinha do altar. Rezamos o Pai Nosso e ela começou uma longa dissertação sobre Jesus. As vezes falava Jesus e as vezes falava Deus.

“Tia Mafalda, quem é Jesus?”
Desde pequena tenho essa péssima mania de interromper as pessoas.
Tia Mafalda fez uma cara de “Valeu por me interromper”, mas respondeu.
“Jesus é filho de Maria e de Deus, e como eu ia dizendo...”
“E quem é Deus?”
Tia Mafalda perdendo a paciência:
“Deus é o pai de Jesus, o criador! Ele que criou tudo: o céu, a terra, os animais, tudo! E como ia dizendo...”
“E quem criou Deus????”
Ela quis me tirar da aula, tenho certeza que quis!
“Como assim quem criou Deus?”
“É! Quem criou Deus? De que lugar ele veio? Ele tem pais?”
Tia Mafalda ficou parada olhando pra mim, desviou seu olhar para o altar como se pedisse aos céus uma resposta coerente para me dar, e assim poder prossegui com a catequização daquelas crianças.
De forma quase que pedagógica, Tia Mafalda explanou:
“Uma vez um homem andava pela praia se perguntando quem era Deus. De repente, ele avistou um garoto que havia acabado de fazer um buraquinho na areia. O garoto corria para o mar, enchia as mãos de água e trazia correndo para jogar no buraquinho. O homem intrigado se aproximou do garoto e perguntou: - O que você pensa que está fazendo garoto? Jamais conseguirá encher esse buraco de areia com água!
O garoto se virou para o homem e disse: É mais fácil colocar toda água do oceano dentro deste buraco, do que entender os mistérios de Deus!”
“Entendeu agora Vivi?”
“Mais ou menos, porque você não me disse de onde ele veio!”
“Não tem como provar que ele existe Vivianne! Isso é fé! Ou você tem ou você não tem!”
Fui pra casa fazendo um enorme esforço para acreditar naquilo tudo. Minha mãe disse que a Tia Mafalda estava certa e desde então escutei muito falar nessa tal de fé. Minhas avós são mulheres de muita fé. Vovó Amália, que já citei aqui e vovó Penha que parece ter um canal direto de comunicação com Deus.

Comecei a procurar pela minha fé. Ela devia estar em algum lugar adormecida dentro de mim. Não é possível que aquela menina que entoava de forma estridente as canções religiosas, já não acreditava em mais nada.
Minha mãe reclamava, pedia, implorava.
“Você não mais à missa Vivianne” “Você precisa ir à missa filha” “Por favor, filha, vamos???”
Mas a missa já não tinha mais sentindo. Não que Deus não tivesse sentido, entende? Mas tudo o que era dito no altar não era absorvido pelo meu cérebro. Entendia tudo como: blá, blá, blá, blá.

Rezava em casa, mas não Ave Maria e Pai Nosso. Rezava como se tivesse conversado com um amigo. Desabafava tudo, ria, chorava, fazia críticas, agradecia, pedia e foi assim que comecei a redescobrir minha fé. Isso só demorou porque eu procurava a fé dentro de mim e não era lá que estava.
Minha fé está nas coisas que eu admiro. A encontrei nas pessoas que eu amo, nos animais, na natureza. Nas coisas que supostamente esse poder maior chamado de Deus, criou em sete dias e sete noites.

Hoje quando acordei e fui passear com Zé, decidi mudar o roteiro. Ao invés de levá-lo ao parque, caminhei com ele até a praia. Sentei na calçada e ele deitou na areia a fim de despedaçar um coco em questão de minutos. Fazia uma manhã esplendida. O sol, mesmo fazendo força para esquentar, já reluzia nas águas do mar. Me emocionei. Lembrei das explicações de Tia Mafalda e vi minha fé ali, brilhando tão forte quanto os raios do sol.

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