Era uma da tarde. O restaurante
estava cheio e o único lugar vazio era ao lado daquela senhora de cabelos
curtos e loiros. Seus olhos eram azuis e seu prato estava cheio, talvez isso
fosse um indicativo para o corpo fora de forma. Ao lado do prato um brigadeiro,
que foi devorado imediatamente logo após o término do almoço.
“Quer que levante para a senhora
passar?” Perguntei achando que o espaço era pouco.
“Não filha, ainda vou tomar o
café. Sou fumante sabe como é?!”
Ela não precisava falar que era
fumante. Com voz mais rouca que a da Nair Belo, qualquer um saberia que ela
fuma pelo menos há uns 30 anos! Quando ela começou a falar foi muito difícil prestar
atenção. Fiquei imaginando o tempo todo
que, se acaso eu não tivesse parado de fumar, eu seria ela no futuro!
Conversamos por volta de uns 20
minutos e foi o tempo suficiente para aquela senhora desconhecida chegar às lágrimas.
Ela tem 67 anos, aposentada, dois
casamentos, sem filhos, fumante, come de mais, não pratica exercícios e diz
levar a vida que gosta. Será?
“Nunca tentou parar de fumar?”
“Não! Tive uma vida muito
estressada. Sempre trabalhei muito.”
“O cigarro é uma das muletas que
temos na vida!”
“Concordo e não sei andar sem
elas.”
Mudou de assunto. Percebi que ela
não estava a fim de falar sobre o vicio e nada adiantaria o que eu falasse
contra ele.
Ela me contou sobre a plástica
que fez aos 55 anos e sobre o ex-marido que a visita todos os dias às 16h e sempre
diz o quanto ela é linda. Falou sobre a mãe com Alzheimer, da profissão de
advogada, dos tempos que jogou na seleção feminina de vôlei, até se emocionar e
falar dos irmãos e de uma sobrinha, que segundo ela, era tratada como filha.
Por um motivo banal, ela teve uma
severa discussão com a irmã, o que resultou no afastamento de todos, inclusive
da sobrinha.
Seu ultimo aniversário e natal foram
marcados pelo absoluto silêncio da família.
“Nem se quer um telefonema!” disse
ela já em lagrimas.
Continuando a conversa disse que
suspeita estar com depressão. Como todos nós já tivemos uma fase “dark”,
receitei a ela os florais que habitaram minha bolsa durante tantos meses!
Levantei para pagar a conta, ela
veio atrás. Enxugando as lagrimas, pedindo desculpas e agradecendo.
Não sabia o que dizer a ela.
Então recorri ao banco de conselhos que minha mãe me dá:
“Perdoe. Família é coisa mais
importante da nossa vida.”
Ela acendeu um cigarro (tinha
um pacote dentro da bolsa), disse que meu brinco era lindo e se foi sozinha, ou não, ainda resta-lhe o vício.